CARTA ABERTA DOS POVOS INDÍGENAS DE MINAS GERAIS: UMA ESCOLA DA VIDA E UMA VIDA NA ESCOLA

CARTA ABERTA DOS POVOS INDÍGENAS DE MINAS GERAIS: UMA ESCOLA DA VIDA E UMA VIDA NA ESCOLA

“É absurdo o corte proposto para o ano de 2021 na ordem de R$15.953.482,00 (quase 16 milhões de reais) para a política estadual de educação indígena”, denunciam Povos Indígenas de MG. Confira a íntegra da Carta aberta, abaixo.

Escola Estadual Indígena Xucuru Kariri Warcanã de Aruanã, na aldeia Xucuru-Kariri, no município de Caldas, no sul de MG.

Nós, os povos indígenas do Estado de Minas Gerais, inspirados pela força e luta de nossos ancestrais, pelo chamado de nossa mãe terra e pela sabedoria de nossos caciques e cacikas, amparados pela Constituição Federal que assegura o direito indígena à educação (Paragrafo 2, art. 10 CF 88), pelo direito internacional de consulta livre, prévia e informada (Convenção 169 da OIT), pela lei estadual nº 22.445 que dispõe sobre a educação escolar indígena e pela lei estadual 23.1777 que cria a categoria Escola Indígena, viemos respeitosamente diante da Secretaria Estadual de Educação (SEE), exigir a retomada de um diálogo democrático e transparente para a resolução dos pontos que nos afetam, pois nossos direitos não são negociáveis e exigimos a manutenção de nossa conquista coletiva, a Política

da Educação Indígena, em sua plenitude. Enumeramos:

1. É absurdo o corte proposto para o ano de 2021 na ordem de R$15.953.482,00 (quase 16 milhões de reais) para a política estadual de educação indígena. Seus efeitos são muito prejudiciais e as escolas já estão sentindo, com a não renovação de contrato de centenas de profissionais, a diminuição de número de turmas e no impacto direto com a redução de estudantes indígenas atendidos. Não podemos admitir que a pandemia seja utilizada como razão para neutralizar nossa conquista coletiva! Para ilustrar, de um levantamento rápido que realizamos de somente 8 das 47 unidades escolares que compõem a política, são 149 servidores não contratados para este presente ano, entre professores, ATB, ASB, pedagogos e entre outros.

2 – Retomada imediata da Comissão Estadual da Educação Escolar Indígena preservando seu caráter democrático, aberto e deliberativo, com direito à participação de diretores, professores, caciques e cacikas e entidades externas de caráter técnico que historicamente contribuíram para a construção da política pública, sendo as reuniões convocadas com antecedência e com a manutenção da sua regularidade.

3 – De 2019 para cá houve mudança drástica na lógica de organização do SIMAD

sendo retirada a especificidade da matriz curricular indígena e de seu quadro de horários, fazendo com o que os diretores tenham que manusear o sistema a partir do padrão genérico, desrespeitando os fundamentos da política estadual e inviabilizando o fechamento do sistema. É necessário a retomada dos padrões em funcionamento em 2019.

4 – Com a ausência das reuniões da Comissão Estadual de Educação Escolar Indígena, o diálogo com a Secretaria Estadual de Educação e com a Superintendências Regionais ficou muito prejudicado, sendo marcado em diversos momentos por uma perspectiva unilateral e coercitiva que não podemos admitir.

5 – É preciso retomar o avanço no sentido do aumento da autonomia das escolas indígenas com a sua desvinculação das escolas não indígenas. Ainda são recorrentes muitos problemas que se baseiam na dependência da escola anexo e do diálogo com os profissionais não indígenas. A Secretaria deve apresentar um plano de autonomização das escolas!

6 – A secretaria de educação e seus demais órgãos necessitam de maior atenção no

tratamento de algumas demandas direcionadas à educação indígena quando estas não correspondem às nossas especificidades culturais como o diário digital, algumas exigências específicas quanto ao calendário escolar e o ensino remoto. É urgente que mesmo diante dos desafios impostos pela pandemia que a Secretaria

de Estado de Educação se esforce para manter as garantias e avanços da Educação Escolar Indígena que se constitui como uma das poucas políticas de estado de reparação por nossos direitos secularmente violados. Exigimos a mais alta atenção e sensibilidade com os fundamentos dessa política que constituem o respeito às nossas singularidades culturais e modos de vida, incorporando nossa forma ser e estar no mundo à educação escolar promovida pelo estado como um direito inclusivo!

Minas Gerais, 30 de março de 2021

Assinam essa nota,

Povos Indígenas de Minas Gerais e

Frente Parlamentar em Defesa dos Povos Indígenas e demais Comunidades

Tradicionais

Comissão Pastoral da Terra (CPT/MG)