CARTA ABERTA À ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DE MINAS GERAIS – 2023 – Rede de Apoio à Estação Ecológica de Arêdes, em Itabirito, MG – Contra o PL 387/2023

CARTA ABERTA À ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DE MINAS GERAIS – 2023 – Rede de Apoio à Estação Ecológica de Arêdes, em Itabirito, MG – Contra o PL 387/2023

Fotos: Movimento “SOMOS AREDES”

Dispõe sobre o Projeto de Lei 387/2023, suas implicações, irregularidades da empresa proponente, a grande perda cultural e socioambiental que irá causar para o Estado e a solicitação de seu arquivamento.

1. Fundamentação

A Estação Ecológica de Arêdes (EEA) instituída pelo Decreto Nº 45.397, de 14 de junho de 2010, conforme Sistema Nacional de Unidades de Conservação (Lei Federal 9985 de 2000 e regulamentado pelo Decreto Federal 4340 de 2002) está inserida no município de Itabirito/MG e integra o Sistema de Áreas Protegidas do Vetor Sul da Região Metropolitana de Belo Horizonte/MG – SAP Vetor Sul. Pode ser considerada Unidade de Conservação “irmã” do Monumento Natural Estadual Serra da Moeda, tendo em vista dentre outros aspectos, um dos objetivos de criação do Monumento ser a “conformação de um corredor ecológico com a EE de Arêdes” (Decreto Estadual 45.472/2.010, artigo 4º).

Localizada em um imóvel, de propriedade do Estado, anteriormente denominado “Fazenda Águas Quentes” que foi desapropriado em 1960. Esta desapropriação ocorreu para a proteção dos mananciais de “Águas Quentes”, existentes no imóvel, e à instalação do Centro de Altos Estudos – CAE, da Área de Experimentação do CETEC e do Museu Ecológico, desdobrado em Horto, Parque, Reserva Natural e Núcleo Científico-Educacional, visando destinar ao local atividades científico-ambientais e culturais (escritura abaixo).

A criação da Estação Ecológica de Arêdes está baseada numa concepção de proteção da flora, fauna, recursos hídricos, manejo de recursos naturais, desenvolvimento de pesquisas científicas e proteção ao patrimônio histórico arqueológico, conforme estabelecido em sua criação (objetivos de criação abaixo, artigo 4º, Decreto Estadual 45.397/2010).

Art. 4º São declarados essenciais aos objetivos de conservação e manejo da Estação Ecológica de Arêdes:

I – o complexo arqueológico de Arêdes e todas as suas ocorrências e vestígios;

II – os antigos conjuntos de ruínas das Fazendas Arêdes e Águas Quentes: casa sede, senzala, capela e curral de pedras;

III – os remanescentes florestais e campestres em diferentes estágios de sucessão ecológica;

IV – os mananciais que convergem para a bacia hidrográfica onde ocorre captação de água para abastecimento humano; e

V – o desenvolvimento de pesquisas em restauração de ecossistemas modificados, conforme disposto no SS 4deg. do art. 8deg. da Lei Federal nº 9.985 de 18 de julho de 2000.

Conforme presente na Lei Federal 9.985/2000, que institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação, as Estações Ecológicas, são consideradas de Proteção Integral, não sendo permitidos impactos diretos e alterações em seu interior, tendo os seguintes objetivos gerais:

Art. 9oA Estação Ecológica tem como objetivo a preservação da natureza e a realização de pesquisas científicas.

§ 1o A Estação Ecológica é de posse e domínio públicos, sendo que as áreas particulares incluídas em seus limites serão desapropriadas, de acordo com o que dispõe a lei.

§ 2o É proibida a visitação pública, exceto quando com objetivo educacional, de acordo com o que dispuser o Plano de Manejo da unidade ou regulamento específico.

§ 3o A pesquisa científica depende de autorização prévia do órgão responsável pela administração da unidade e está sujeita às condições e restrições por este estabelecidas, bem como àquelas previstas em regulamento.

§ 4o Na Estação Ecológica só podem ser permitidas alterações dos ecossistemas no caso de:

I – medidas que visem a restauração de ecossistemas modificados;

II – manejo de espécies com o fim de preservar a diversidade biológica;

III – coleta de componentes dos ecossistemas com finalidades científicas;

IV – pesquisas científicas cujo impacto sobre o ambiente seja maior do que aquele causado pela simples observação ou pela coleta controlada de componentes dos ecossistemas, em uma área correspondente a no máximo três por cento da extensão total da unidade e até o limite de um mil e quinhentos hectares.

Busca-se, nesse contexto, formar um mosaico de áreas protegidas, na região dos Inconfidentes, fortalecido no que diz respeito às estratégias de proteção, gestão, fiscalização e preservação do meio ambiente executadas pelo Estado de Minas Gerais.

Segundo a análise das áreas prioritárias para a conservação em Minas Gerais (DRUMMOND, 2005) a região de Arêdes pode ser classificada de importância biológica extrema para a avifauna; especial para a herpetofauna; extrema e potencial para os invertebrados. A EEA esta inserida ainda entre duas áreas de importância biológica alta (Serra do Rola Moça e Complexo Andorinha/Itacolomi). A Flora na Estação Ecológica de Arêdes, segundo a mesma fonte de informação, é considerada como prioridade extrema e especial. Abaixo algumas espécies da flora ameaçadas de extinção, existentesna área de campo rupestre ferruginoso, hoje consolidada e protegida.

Vriesea minarum (Bromeliaceae)
Anemopaegma arvense (Bignoniaceae)
Sinningia rupicula (Gesneriaceae)
Euplassa semicostata (Proteaceae)
Arthrocereus glaziovii (Cactaceae)
Chionolaena lychnoforioides (Asteraceae)

Outra função exercida atualmente pela Estação e em conjunto pelo Monumento Natural Estadual da Serra da Moeda (prevista no Decreto Estadual 45.472/2.010, artigo 4º), é a manutenção de um corredor ecológico, que propicia a ligação entre as Bacias Hidrográficas dos Rios das Velhas e Paraopeba. Os corredores ecológicos tem a função de assegurar o fluxo não só da fauna existente na região, mas promover a troca gênica, resguardando o Patrimônio Genético Nacional (Lei Federal 13123/2015, artigo 2º; Lei Federal 9985/2000, artigos 2º, inciso XIX, 4º e 5º). Considerando-se que as “ilhas de campos ferruginosos” existem isoladas a milhões de anos nas serras do Quadrilátero Ferrífero, sendo diferentes uns dos outros  em cada serra. Assim, na Serra de Itabirito, que já é a mais devastada nesta região, este campo preservado dentro da Estação Ecológica de Arêdes, guarda características únicas. Por exemplo, uma mesma espécie de planta produz qualidades diferentes de principio ativo (necessário para cura de uma doença) dependendo do lugar em que se encontra, assim, a importância de se preservar áreas silvestres diferenciadas com esta.  A implantação do Projeto de Lei proposto irá bloquear permanentemente (com escavações e remoção de solo) o fluxo natural formado por este corredor entre a Estação Ecológica de Arêdes e Monumento Natural Serra da Moeda.

Além de afetar a destinação a que se pretende e as características ecológicas mencionadas, a exploração mineral proposta afeta diretamente, na cabeceira da bacia do Córrego do Bação (flanco leste da Serra das Serrinhas), as principais nascentes que deságuam no curso d’água de mesmo nome, manancial de captação de água essencial para abastecimento humano do município de Itabirito. No flanco oeste, impacta na qualidade e quantidade das águas que vertem para o Ribeirão Aredes, que com outros tributários como os córregos Benevides e Bugre convergem para o Ribeirão do Silva. Este por sua vez, junta-se ao Rio das Velhas para formar o manancial, que através da captação de Bela Fama, abastece com água potável a cidade de Belo Horizonte e 34 cidades da Região Metropolitana. Diante das alterações climáticas, com a extensão dos períodos de seca e chuva imprevisíveis, a preservação absoluta destas áreas é ainda mais estratégica.

Ressalta-se que a EEA, a despeito do que é alegado pela MINAR, já cumpre sua função de área destinada a projetos de pesquisa, conforme Lei Federal 9985/2000, ressaltando as de cunho ambiental, servindo a pesquisadores da Universidade Federal de Ouro Preto e Universidade Federal de Minas Gerais, sendo garantia da conservação da representatividade de ecossistemas (Lei Federal 9985, artigo 5º) em uma região já tão alterada e saturada de atividades minerárias.

Uma característica que diferencia a EEA é a presença de Sítios Arqueológicos, historicamente bem documentados, que são parte integrante de uma complexa cadeia de ruínas e estruturas remanescentes de alvenaria de pedra, configurando arquitetura rara e vernacular, localizadas no chamado Sinclinal Moeda, região do Quadrilátero Ferrífero, que testemunhou os primórdios da mineração e suas antigas tecnologias, da produção e comercialização de alimentos em Minas Gerais. A proposta de desafetação apresentada causaria, como ocorrera anteriormente, impactos irremediáveis a bens arqueológicos e à paisagem cultural, podendo levar a perda e fruição deste patrimônio público.

Até meados do ano de 2008 a empresa MINAR causou inúmeros danos ao patrimônio arqueológico e paisagístico, sem nunca ter, realizado sequer uma ação para sua efetiva proteção e recuperação dos prejuízos causados. Abaixo, seguem fotos da época da operação da MINAR, mostrando como estava sendo severamente ameaçado e depredado o patrimônio arqueológico setecentista, nas áreas escavadas da cratera para retirada de material, chegando próximo às demais estruturas.

Áreas escavadas dentro do sítio arqueológico, o que causou a perda permanente do patrimônio

Áreas escavadas dentro do sítio arqueológico, o que causou a perda permanente do patrimônio

Acima, situação em que chegou a ficar a antiga cava de ouro, devido as atividades da empresa, que a utilizava como depósito de finos de rejeitos e circulava com suas máquinas na área do sítio arqueológico.

Imagem do ano de 2006, durante as atividades da MINAR
Imagem do ano de 2011, após o encerramento das atividades da MINAR e início dos trabalhos de recuperação executados pelo IEF e parceiros

As imagens acima demonstram, de forma inequívoca, que permitir a localização da atividade de exploração nesta área proposta pelo PL 387/2023, irá causar a destruição da paisagem de ecossistemas em um raio que não pode ser definido e não pode ser controlado por nenhum processo de monitoramento, pois a destruição é inerente a existência da atividade de mineração.

Pertinente observar, que a MINAR, sempre realizou suas atividades de forma legalmente precária, sem ficar ao certo entendido por qual forma poderia obter alguns tipos de autorizações, tendo em vista, inclusive, que o superficiário do terreno, à época o CETEC – Fundação Centro Tecnológico de Minas Gerais, nunca havia autorizada a exploração (cópia do ofício abaixo). Desta forma, constata-se a ilegalidade no uso do Direito Minerário, já naquela época.

Ofício informando a ausência de autorização do CETEC e descumprimento da legislação.

Ofício informando que foi solicitado ao Departamento Nacional de Produção Minerária (atual Agencia Nacional de Mineração – ANM), pedindo um levantamento sobre as atividades de exploração no local

Atualmente a MINAR, atua dentro da Unidade de Conservação, ocupando o território indevidamente através da instalação de placas e ocupação do território, já impedindo a visitação e continuidade de projetos de recuperação nas proximidades. Abaixo placa da MINAR instalada dentro da Estação Ecológica.

Uma das placas da MINAR com pelo menos 4 metros de altura, dentro da área da Unidade de Conservação

2. Inconsistências da proposta (PL 387/2023)

A proposta de lei reduz os limites originais da unidade de conservação comprometendo os atributos especiais que justificaram sua criação prejudicando, entre outros, a conservação integrada do Complexo Arqueológico de Aredes, causando destruição na cabeceira da bacia hidrográfica que abastece à população e propiciando a destruição de ecossistemas raros, não atendendo ao princípio da prevenção e da precaução. Se tal proposta prospera, todas as unidades de conservação de proteção integral estarão sujeitas a perda de áreas importantes, por possuírem direitos minerários em seu interior. É assim que os parques mineiros serão tratados? Importantíssimo ressaltar que a proposta de troca inclui a instalação de estruturas de visitação com dinheiro público – pois trata-se de compensação ambiental – em área contígua ao empreendimento minerário proposto, abaixo das estruturas previstas como barragem de água e empilhamentos à montante (bom lembrar do recente caso da Mina de Pau-branco em 2022). Resumindo, o que está proposto é que se permita atividade minerária a montante da unidade de conservação, notadamente sobre as estruturas de recebimento de escolas, demais visitantes e escritório administrativo, pergunta-se: a lição de Brumadinho não foi aprendida? A sociedade de Minas Gerais estará fadada a cegueira da ganância? O estudo apresenta justificativas falsas ou no mínimo vagas, conforme os itens abaixo retirados do PL (itens 1,2,3 e 4). Na sequencia são expostos estes itens e a justificativa para sua não implementação.

1) “Ampliação da Estação Ecológica Estadual de Arêdes, com o acréscimo de área de relevância ambiental e arqueológica indevidamente excluída da Unidade de Conservação”

A área proposta para compensar não possui a relevância ambiental e arqueológica da área a ser excluída. A despeito da maior dimensão territorial não possui áreas de campo rupestre ferruginoso onde ocorrem inúmeras espécies da flora ameaçadas de extinção e ao mesmo tempo não possui os atributos históricos arqueólogos da outra área que propõem desafetar. Pelo contrário, tem seu uso voltado para pastagem, sofrendo com queimadas e possuindo em quase sua totalidade a predominância uma única espécie de capim. Além disso, propõem trocar área pertencente ao Estado (já desapropriadas e incorporadoras a Estação Ecológica) por área particular, conforme documentação da propriedade: “imóvel de propriedade de  (…)  viúva-meieira, constituído por terreno de 14 alqueires, situado no lugar denominado Valenti ou Aredes”. Neste sentido, a proposta incube ao Estado todos os ônus necessários para desapropriação, levando a sociedade mineira a adquirir um terreno na cifra de milhões de reais, tendo em vista que o mesmo não pertence a empresa proponente.

2) “Permissão da manutenção da atividade econômica sustentável há décadas exercida em área notoriamente antropizada e desprovida de relevância ambiental e arqueológica, sendo tal atividade a principal fonte de sustento e de geração de riquezas para a população local, de modo a viabilizar o desenvolvimento socioeconômico sustentável local e regional e o acréscimo de arrecadação pelo Poder Público”

Ressalta-se que a área que se pretende desafetar não é considerada desprovida de relevância ambiental e arqueológica, pelo contrário possuí áreas de vegetação nativa bem preservadas (destacando campos rupestres ferruginosos em elevado grau de conservação, tendo sido este um dos motivos da sua localização dentro da unidade de conservação. Em outra toada, a proteção como unidade de conservação de proteção integral nos últimos anos, em nenhum momento prejudicou o sustento da população local, sendo esta afirmação uma grande inverdade. 

3) “Eliminação do grave impacto econômico-financeiro atribuído ao Estado de Minas Gerais quando da criação da Unidade de Conservação, eliminando-se o risco da imposição ao Estado de Minas Gerais da obrigação de indenizar os atores privados e a própria União pelos direitos minerários afetados.”

Os atuais proprietários adquiriram os títulos minerários cientes da existência da Unidade de Conservação já instituída, portanto incorreram no risco de livre e espontânea vontade, contando com a alteração da lei de forma (no mínimo) oportunista, para atender unicamente seus interesses particulares em detrimento da coletividade.

4) “Garantia de meios para se assegurar o fomento à infraestrutura necessária para a consecução dos objetivos da Estação Ecológica Estadual de Arêdes, através da imposição de condicionantes e do estabelecimento de parcerias, dando-se estas especialmente pela aprovação do projeto de criação do Espaço Arêdes e de outras estruturas, conforme idealizado no estudo que fundamenta o presente projeto de lei.”

Não deve-se pensar que, para se equipar uma Unidade de Conservação, deva-se mutilar e ceder partes importantes de sua área, pois assim se perderia o sentido de sua criação, sendo no fim apenas uma forma de se negociar recursos financeiros. Ressalta-se que foi utilizado, no presente PL, um estudo elaborado para outra finalidade e acrescenta-se a isto a utilização capiciosa de partes do Plano de Manejo elaborado para a Estação Ecológica. Assim é flagrante que, a empresa quer legitimar, através da integridade da ALMG, uma atividade legalmente e tecnicamente inviável, causando risco para a população mineira.

3. Multas

Após o abandono de uma barragem de rejeitos dentro  Estação Ecológica, a MINAR foi obrigada judicialmente a realizar o descomissionamento (autos 0063751-17.2015.4.01.3800). Apesar disto a empresa demonstra que continua a se enquadrar no rol das empresas despreocupadas e negligentes com a técnica e a legalidade, tendo sido multada pelo menos cinco vezes por desrespeito às normas e técnicas presentes na lei de Segurança de Barragens. 

Seguem abaixo o registro das autuações realizadas pelas ilegalidades cometidas:


Multa 1.

Multa 2.

Multa 3.

Multa 4.

Multa 5.



4. Pedido de arquivamento

Tendo em vista as inconsistências e contradições do PL 387/2023, as irregularidades apresentadas pela empresa MINAR, bem como o retrocesso ambiental e patrimonial do citado PL, a Sociedade Civil Organizada, através da “REDE DE APOIO A ESTAÇÃO ECOLÓGICA DE ARÊDES” redigiu o Manifesto anexo, ressaltando os absurdos do projeto de lei e exigindo o seu arquivamento.

Conforme apresentado no Manifesto, conclui-se que a desafetação desta porção da Estação Ecológica de Arêdes, além de prejudicar as ações para proteção da Biodiversidade e Desenvolvimento Sustentável executadas pelo Estado, significará um retrocesso irreversível para conservação ambiental e patrimonial de Minas Gerais e causará principalmente os seguintes impactos:

1. Degradação de zonas de drenagem que convergem para áreas de captação de recursos hídricos que tem como destinação final o abastecimento humano de Itabirito e mais a jusante, a região Metropolitana de Belo Horizonte;

2. Perda da possibilidade de visualização do histórico, evolução das atividades, tecnologias construtivas e minerárias in loco na Estação Ecológica de Arêdes, levando-se em conta o conjunto de sítios e estruturas arqueológicas ali existentes, sua ambiência e paisagens culturais componentes; 

3. Detrimento ao desenvolvimento de pesquisas em áreas de recuperação e preservação de ecossistemas endêmicos, principalmente no que diz respeito a projetos de restauração de ecossistemas modificados, conforme disposto no art. 8°, § 4° da Lei Federal 9985 de 2000.

Finalizando, para garantir o direito das gerações atuais e futuras “ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida” (Artigo 225, Constituição Federal), socialmente responsável, lastreado pelo princípio do Desenvolvimento Sustentável, solicita-se o arquivamento do Projeto de Lei 387/2023.

MANIFESTO da rede de proteção da ESTAÇÃO ECOLÓGICA DE ARÊDES (EEA), em Itabirito, MG: repudiamos com veemência o PL 387 que visa minerar em ARÊDES

Excelentíssimos senhor Governador Romeu Zema e Presidente da Assembléia Legislativa de Minas Gerais, Tadeu Martins Leite, deputados/as da ALMG, secretários/as de Estado, imprensa, autoridades e toda a sociedade civil.

Nós, representantes da Sociedade Civil, amigos/a e Rede de Apoio da Estação Ecológica Estadual de Arêdes (EEA), em Itabirito, MG, vimos à presença de Vossa Excelência e aos Excelentíssimos (as) Senhores (as) Secretários(as) de Estado e Deputados(as) Estaduais de Minas Gerais, à Senhora Diretora Geral do IEF e ao Ministério Público Estadual expressar a nossa grande indignação quanto às graves consequências da proposta presente no Projeto de Lei 387/2023 que propõe alterar (desafetar) os limites da Estação Ecológica de Arêdes. Esse brutal, violento e injusto PL 387 visa possibilitar que áreas de relevante importância para os objetivos de criação desta Unidade de Conservação sejam destinadas a exploração minerária, atendendo à ganância tão somente de uma empresa mineradora, a Minar, que tanto degradou a região no passado, desconsiderando os demais aspectos socioambientais, tão necessários para garantir o desenvolvimento sustentável no Estado de Minas Gerais.

Não obstante proporcionar uma significativa alteração da dinâmica da Estação Ecológica de Arêdes, criada pelo Decreto Estadual nº. 45.397 de 14 de junho de 2010, alterado pelo Decreto Estadual nº.  46.322 de 30 de setembro de 2013, com fundamento na Lei n°. 19.555 de 09 de agosto de 2011, este Projeto de Lei 387 retira uma grande e importante gleba da área original dessa relevante Unidade de Conservação, sem que os critérios técnicos tenham sido evidenciados e devidamente analisados e segundo a nossa percepção, sem que tenha havido maiores discussões com a sociedade. Essa alteração de limites gera inclusive, os seguintes graves conflitos/retrocessos: 

  1. Desafetação de cerca de 280 mil metros quadrados (cerca de 28 hectares)  da bacia hidrográfica do Córrego do Bação (cabeceira do Alto Rio das Velhas), que alimenta nascentes que abastecem 80% da população da cidade de Itabirito. A água necessária para abastecimento humano sofrerá risco de ter sua bacia hidrográfica descaracterizada, sob a pena de se perder definitivamente um bem comum que já está escasso. A crise hídrica se agrava em uma progressão geométrica. Preservar as nascentes e os mananciais se tornou uma necessidade para a sobrevivência da população. Não é aceitável e nem justo e ético que uma atividade proponha explorar estas áreas;

  2. A área onde a mineradora Minar pretende ocupar com sua escavação e demais estruturas formará um obstáculo linear de pelo menos mil metros, o que inviabilizará definitivamente o Corredor Ecológico que hoje liga as bacias do rio Paraopeba e rio das Velhas, prejudicando diretamente um dos objetivos de criação do Monumento Natural Estadual da Serra da Moeda. Um corredor ecológico integra porções de ecossistemas naturais ou seminaturais, ligando unidades de conservação, que possibilitam entre elas o fluxo de genes e o movimento da biota, facilitando a dispersão de espécies e a recuperação de áreas degradadas, bem como a manutenção de populações que demandam para sua sobrevivência áreas com extensão maior do que aquela das unidades individuais.

  3. Destruição do último campo ferruginoso que restou protegido na Serra de Itabirito. Este campo nativo, que está em alto grau de conservação, é considerado Zona Primitiva da Estação Ecológica sendo essencial para o desenvolvimento de pesquisas, guarda um remanescente embrionário formado a 60 milhões de anos e indispensável para propiciar a recuperação das áreas exploradas pelas mineradoras do entorno (mineradoras Vale S/A, Gerdau, SAFM e Herculano). Para o conjunto de características naturais relevantes da Estação Ecológica de Arêdes, este campo nativo mantem a representatividade dos ecossistemas que antes existiam no quadrilátero ferrífero e aquífero, e na Serra de Itabirito já saturada de destruição, e hoje caminham aceleradamente para a extinção. Será a nossa geração a última a poder ver este ecossistema na natureza? O PL 387, se for aprovado, devastará tudo isso.
  • Redução drástica do valor cultural e paisagístico do Complexo Arqueológico de Arêdes, pela sua fragmentação e destruição de estruturas componentes. Trata-se de Complexo Histórico-Arqueológico oriundo do séc. XVIII composto por conjuntos e unidades isoladas (casas, capela, muros, currais, casa de fundição, canais, catas antigas, dentre outros), confeccionados em alvenaria de pedra, portanto, exemplar raro da arquitetura vernacular mineira, com acabamentos variados, compostos por blocos de canga e ou de quartzito em cantaria. Quem irá querer conhecer um patrimônio em local onde também estará acontecendo a exploração minerária com todos seus impactos, barulhos, poeiras e riscos? Como este patrimônio poderá fruir para nossa sociedade? Hoje a Estação Ecológica pode receber escolas e demais visitantes, no entanto, este PL 387 prevê que, à montante das áreas propícias para visitação e passeios escolares, estará uma atividade com tantos parâmetros de segurança a serem atendidos devido ao grau de risco elevado da atividade. Isto não pode ser conciliado. Não aprendemos nada com os crimes brutais e hediondos das mineradoras em conluio com o Estado em Bento Rodrigues/Mariana e em Brumadinho, que afetaram drasticamente as bacias dos vales dos rios Doce e Paraopeba? Quantos outros crimes cada vez mais brutais deixaremos acontecer com a ação devastadora das mineradoras?
  • Estamos em um momento de transição, os governos e populações das cidades mineradoras buscam a diversificação econômica e a possibilidade de se desenvolver de forma limpa. Os municípios e as comunidades precisam com urgência se libertarem da mineriodependência que escraviza e superexplora o povo e os ecossistemas cada vez mais. Não é possível mais que uma atividade econômica impeça o desenvolvimento de outras. Assim como o Distrito de São Gonçalo do Bação, o Monumento Natural da Serra da Moeda, a Serra do Curral e a nossa Estação Ecológica de Arêdes, em Itabirito e tantos outros bens potenciais para o turismo e com seu valor intrínseco devem ser leoninamente defendidos, por nós que nos importamos com nossa terra.

Assim sendo, apelamos a Vossas Excelências que arquivem definitivamente o Projeto de  Lei 387, que se for aprovado, abrirá caminho para brutal devastação da Estação Ecológica de Arêdes e sacrificará nascentes e córrego que estão na cabeceira do rio das Velhas e comprometerá inclusive o abastecimento público de Belo Horizonte e Região Metropolitana. A mineradora Minar já degradou de forma brutal esta região no passado. O PL 387 só gerará lucro e acumulação de capital para a mineradora Minar e retirará dos nossos descendentes o restante deste precioso bem cultural, histórico, arqueológico e natural, que temos a obrigação de proteger, como Coletividade. O Governo de Minas Gerais e os deputados/as também têm a obrigação de garantir a preservação da Estação Ecológica de Arêdes. Pelo expresso acima, repudiamos com veemência o PL 387 e exigimos o seu arquivamento. Fora, PL 387/23 que atende a lobby da mineradora Minar. 

Respeitosamente, assinam este Manifesto:
1 – Rede de Apoio à Estação Ecológica de Arêdes, Itabirito, MG: “SOMOS TODOS AREDES”. 

2 – Comissão Pastoral da Terra (CPT/MG)

3 – Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva (CEDEFES)

4 – Associação dos Moradores de São Gonçalo do Bação, Itabirito, MG

5 – Movimento pelas Serras e Águas de Minas – MovSAM

6 – Movimento pela Preservação da Serra do Gandarela 

7 – UAI – União Ambientalista de Itabirito

8 – Abrace Cercadinho

9 – Cercadinho e Ponte Queimada – Córregos Vivos

10 – Associação dos Proprietários Rurais do Santuário Serra da Moeda 

11 – Fórum Permanente São Francisco 

12 – Movimento Artístico, Cultural e Ambiental de Caeté – MACACA 

13 – Movimento Eu Rejeito Barragens Sabará

14 – União das Associações Comunitárias de Congonhas

15 – PLANTAE – A P U Spinel Informação, Ensino, Arte e Cultura LTDA

16 – Grupo de Teatro São Gonçalo de Bação

17 – ONG Abrace a Serra da Moeda

18 – Projeto Manuelzão

19 – APHAA-BV – Associação do Patrimônio Histórico, Artísitico e Ambiental de Belo Vale 

20 – Instituto Guaicuy

21 – Brigadas Populares

22 – Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB)

23 – Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos (CEBI)

24 – Movimento Negro Unificado (MMU)

                                          Itabirito, MG, 13 de setembro de 2023.