COMUNIDADE TRADICIONAL CABECEIRA DO PIABANHA: UM TERRITÓRIO MARCADO PELA EXPLORAÇÃO E A EXPROPRIAÇÃO. Por Edivaldo Ferreira Lopes1 -UFVJM – edivaldocpt@gmail.com – e Letícia A. Rocha2 -UNIMONTES – leticiarochaidp@gmail.com
PALAVRAS–CHAVE: Território. Cabeceira do Piabanha. Conflitos. Fazenda/fazendeiros.
Resumo
Neste trabalho discutimos sobre os processos de exploração e expropriação que a Comunidade Tradicional Agroextrativista e Artesã Cabeceira do Piabanha em Salto da Divisa/ MG, baixo Vale do Jequitinhonha, tem sofrido. Este artigo é parte da pesquisa do Mestrado Acadêmico em Estudos Rurais da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, que teve como objetivos investigar os processos de ocupação, o domínio fundiário e identificar os fatores que vem desencadeando diversos conflitos e as formas de organização e estratégias de resistência que a comunidade tem empreendido para defender o seu território, frente às pressões sofridas. É uma pesquisa qualitativa, ancorada na abordagem metodológica da pesquisa participante e da observação participante (BRANDÃO & BORGES, 2007; THIOLLENT, 1999). Além da pesquisa bibliográfica, foram realizados estudo de documentos da associação, documentos de terras e outros documentos oficiais e entrevistas com moradores da comunidade. A história da comunidade tradicional Cabeceira do Piabanha se insere, de maneira contundente, nas formas que o capital utiliza para se expandir no campo. Desde o ano de 1952, data em que ocorreu a ocupação do território pelos pioneiros, até a atualidade, a comunidade tem sido vítima de processos de exploração e expropriação, em sua maioria, praticadas por fazendeiros. Mais do que conivente com essa situação, o Estado brasileiro tem impulsionado alguns desses processos de forma direta ou indireta.
Introdução
No Brasil, desde o processo de colonização, o Estado tem sido um agente mediador e subsidiário do modelo de desenvolvimento expropriador e explorador dos/as camponeses/as em todo o território nacional. Por meio de subsídios financeiros e do ordenamento jurídico, o Estado garante a manutenção da grande propriedade e o lucro do capitalista agroindustrial e outros setores da sociedade pagam os ônus desta remuneração. Neste contexto, é que ocorrem os maiores impactos aos camponeses/as no Brasil, onde milhões de camponeses/as se tornam proletários/as a serviço do capital, no campo e na cidade, (WANDERLEI, 2009; OLIVEIRA, 2001, 1994; MARTINS, 1982, 1983, 1986a, 1986b, 1999 e 2012). O capitalismo agrário/ industrial se desenvolveu no Brasil, a partir da concentração da terra, tendo o Estado como seu
principal agente mediador. Desde o processo de colonização, por meio da doação de terras via sesmarias e depois por incentivos fiscais e financeiros. Historicamente, o Estado assumiu um papel que tem sido preponderante na geração e reprodução política e econômica da agricultura dominante no país, (WANDERLEI, 2009).
No Vale do Jequitinhonha, a expansão das atividades de produção capitalista não foi diferente do que ocorreu em outras regiões do país. Os sucessivos Governos com discursos ideológicos de desenvolvimento para o “Vale da Miséria”, implantaram muitos projetos que na prática, contribuíram muito para acirramento dos conflitos socioambientais e consequentemente, para o êxodo rural, pela expulsão direta ou indireta dos/as camponeses/as de seu chão de morada e de cultivo, expondo milhares deles/as à migração definitiva ou sazonal, (SERVILHA, 2012; SILVA, 1999, LEITE, 2015).
A partir da década de 1970, com o fortalecimento da pecuária extensiva, o avanço da monocultura de eucalipto, a criação de unidades de conservação, a construção de usinas hidrelétricas e a chegada da mineração, têm crescido os processos de expropriação e exploração precedidos, muitas vezes, por violência física e simbólica, contra os camponeses/ as. Consequentemente, as terras que antes eram o lugar de expressão e reprodução do modo de vida camponês, são cobiçadas por latifundiários e por empresas e alvo da política ambiental dos Governos que passaram a promover a disputa pelos territórios camponeses, acirrando os conflitos socioambientais e, consequentemente, a expulsão direta ou indireta das comunidades do campo.
No Vale do Jequitinhonha, especialmente no baixo Vale, a fazenda viabilizou um modelo de poder baseado no mandonismo do fazendeiro. O poder originou-se da exploração da natureza e da força de trabalho dos trabalhadores rurais que antes eram os donos das terras, passando a produtores de riqueza para o fazendeiro que, por sua vez, além de se apropriar da riqueza, também passa a distribuir “justiça” segundo suas próprias leis, dentro dos horizontes da fazenda e até mesmo fora dela. O poder da fazenda não ficou restrito aos mourões das cercas do latifúndio, (RIBEIRO, 1996, 2003; MOURA, 1988).
A fazenda em processo de formação, através de seus mentores, além de se apropriar das terras dos/as camponeses/as posseiros/as, se apropriou da mão de obra dos mesmos para derrubadas das matas e para o plantio e manutenção de pastagens, tornando-os agregados nas terras que antes eram suas posses. O agregado tinha a função de derrubar a mata e plantar principalmente milho, feijão e mandioca e na próxima safra teria que fazer nova derrubada, pois, aquela área deveria ser destinada a pastagem. Assim, foram derrubando, até acabar com as matas da região, (RIBEIRO, 1996, 2003; MOURA, 1988). Com o fim das matas, muitos foram expulsos e os que permaneceram, praticamente ficaram sem espaço para produção e passaram a serem diaristas na manutenção de fazendas. O sistema de agregação vigorou até as últimas décadas do século XX, ficando a terra monopolizada sob o domínio de poucos que conseguiram se apropriar documentalmente.
No Vale do Jequitinhonha, desde o início do processo de colonização, o Estado tem atuado para criar as condições necessárias para a constituição e formação das grandes fazendas de gado. A atuação do Estado inicia-se com a imposição da força por meio da chamada “Guerra Justa” contra os índios que resistiam na defesa de seu território. Depois, por meio de incentivos fiscais, financeiros e pelo aparato legal, concedendo grandes glebas de terras que, em muitos casos, já eram posses camponesas. O Estado garantiu os meios necessários para a concentração da terra nas mãos de poucos latifundiários e empresas, bem como, a expropriação e a exploração dos camponeses/as e generalizou os conflitos no campo. Para garantir a implantação dos grandes projetos capitalistas são utilizados discursos ideológicos que preconizam o progresso e o bem-estar social a população que “carece de desenvolvimento”, pois vivem no “Vale da Miséria”. Segundo Habermas (1983), o Estado garante “[…] as premissas para a existência de um processo econômico despolitizado, liberto de normas éticas e de orientações ligadas ao valor-de-uso” (HABERMAS, 1983, p. 229).
Para enfrentar as adversidades que historicamente estão expostos, as quais dificulta a reprodução dos seus modos de vida, os/as camponeses/as sempre tiveram muitas estratégias. Alguns como agregados em grandes fazendas, outros saíram à procura de terras mais distantes, outros – por não conseguir a manutenção na própria terra, trabalhavam em outras terras ou ainda enfrentaram a migração sazonal. Todas as estratégias construídas pelos camponeses/as têm por objetivo, garantir a reprodução de seus modos particulares de vida. É nessa realidade, em meio a diversos conflitos, que a comunidade tradicional Cabeceira do Piabanha vem lutando para manter em seu território.
Comunidade Tradicional Cabeceira do Piabanha
A comunidade Tradicional Cabeceira do Piabanha, está localizada às margens do Córrego Piabanha no município de Salto da Divisa, baixo Vale do Jequitinhonha, nordeste de Minas Gerais, na divisa com o sul da Bahia, (FIG. 1).
Figura 1 – Mapa de localização da Comunidade Cabeceira da Piabanha.
Os fazendeiros que atualmente alegam possuir a propriedade das terras, tradicionalmente ocupadas pelos comunitários de Cabeceira do Piabanha, são herdeiros do Sylvio Pimenta. Aqueles, desde 2014, vêm, ora pressionando as famílias para saírem do território, ora assediando com ofertas em dinheiro pela aquisição dos seus direitos de posse e benfeitorias. Diante das pressões vivenciadas, a família do patriarca Manoel Cachoeira e as famílias de 03 filhos, venderam os direitos de posse, após fechar acordos extrajudiciais com um dos pretensos fazendeiros. Como consequência das pressões sofridas, a comunidade vem passando por um processo de esvaziamento. Atualmente, residem no território 08 famílias, totalizando 26 moradores residentes, sendo 17 adultos, 02 crianças, 05 adolescentes e 02 idosos.
Os primeiros moradores da comunidade chegaram à localidade no ano de 1952. Os pioneiros são originários da Bahia, que vieram para a região em busca de terras de mata para morar e plantar. A caracterização do espaço escolhido para o estabelecimento do modo de vida tradicional é feita por um comunitário “aqui só tinha mata, onça, paca, caititu, cobra e tatu”.
Todos os moradores afirmam que, desde que vieram morar no território, sempre tiveram e tem como prática o extrativismo e a agricultura tradicional, conhecida pelos comunitários como roça de toco ou de coivara.
O preparo da roça de toco ou de coivara, no passado, era iniciado com a derrubada da mata, acompanhado do uso do fogo. Em seguida, vinha o plantio realizado entre os tocos e árvores remanescentes. Com a diminuição da fertilidade natural da terra, a área é deixada em “descanso” (pousio), ou ainda é plantado outro tipo de cultura. Os períodos de descanso podem durar de 02 a 05 anos, dependendo da necessidade e disponibilidade de áreas para tal fim. Tal técnica de pousio ou de “descanso da terra” como conhecido na comunidade, é assim justificada pelos comunitários: “a terra é como a gente, assim como a gente cansa e precisa de descanso, a terra também cansa e precisa de descanso3”. Nesta mesma direção a Luzeni afirmou: “a gente descansa em um dia ou dois e a terra precisa de mais tempo para descansar”4.
A agricultura tradicional e o extrativismo se mantêm como a base de sustentação das famílias da Comunidade Cabeceira da Piabanha. Com uma diversidade de produtos, como: 5 variedades de feijão (carioca, carioquinha, calentinha ou rosinha e feijão bosta de coelho); milho (vermelho e palha roxa); 21 variedades de mandioca (Aipim Brasil, Aipim Manteiga, Aipim Roxa, Cacau, Cacauzinha, Calipinha, Calombo, Cramuquém, Enrica Homem, Jacobina, Jordaninha, Lisona, Olho Roxo, Pacaré, Parazinha, Preta Rica, Pretinha, Pretona, Santa Cruz, Tapicuru e Unha); 12 variedades de banana (caturra, caturrinha, china, da terra, da terra maranhão, maçã, prata, prata maranhão, prata caturra, roxa, roxa branca e três pencas); frutas: laranja, limão, tangerina, manga, coco, abacate, abacaxi, melancia, jaca, acerola, mamão, maracujá, graviola, goiaba; hortaliças: couve, alface, coentro, cebola, rúcula, salsa, cenoura, mostarda, beterraba e outras; e outros produtos como cacau, café, chuchu, urucum, batata, cana (caiana, caiana preta, fista, obassa e pitu), abobora/moranga, e pimenta, Além da criação de pequenos animais, como porcos, galinhas e peixes.
Esta grande quantidade e variedade de produtos não têm como finalidade principal trocas mercantis, mas sim, para o autoconsumo e doações. Isso não significa que a comunidade é alheia à relação com o mercado. As famílias utilizam distintos meios para a comercialização do excedente da produção, destacando-se: venda para o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE); venda na feira livre do município, entrega em domicílio e venda para comerciantes na cidade de Salto da Divisa.
Os processos produtivos são ajustados a partir de modos historicamente constituídos, com uma diversidade considerável. O arranjo espacial das áreas produtivas (roças) presentes no território revela que a organização ali presente é compatível com as condições materiais existentes: o uso familiar e o uso comunitário das terras.
No passado o extrativismo e o artesanato foram práticas bastante utilizadas pela comunidade. Tais atividades, agora com menos intensidade, devido às restrições imposta pelo Parque Estadual Alto Cariri5. Como forma de exemplificação, citamos aqui alguns dos objetos de artesanato fabricados e utilizados pela comunidade: vassouras de rejeira, jequiá e imbé (tipos de cipós existentes no território), balaios feitos de cipós de caititu (cipó São João) e de cipó alho, (balaio é utilizado para transporte nos animais de serviço). Já foram confeccionados: cestos para utilização doméstica e outros fins, peneiras de taboca para “soprar feijão” e refinar a massa de mandioca para farinha, palmito e castanhas de cocos, palha de coqueiro (palmeira) para cobertura das casas e paióis para armazenar milho e feijão. Somam-se a estes, outra grande quantidade de utensílios feitos com argila e madeira que já não são confeccionados, mas ainda estão presente na memória dos/as comunitários/as.
A agricultura e o extrativismo se somam a uma multiplicidade de outras relações, de usos e apropriação do território de caráter não capitalista, que completa o modo de vida tradicional da comunidade. As condições naturais do território (alta precipitação, terra fértil, fauna e flora abundantes), viabilizam a reprodução sociocultural da comunidade. As práticas agrícolas utilizadas pela comunidade são fundadas na experiência e repassadas de geração em geração.
Cabeceira do Piabanha: Uma História Marcada pela Expropriação e a Violência.
Segundo Oliveira (2007) e Martins (1983), no Brasil o camponês é um sujeito social de dentro do capitalismo, portanto, é uma classe social que, ao longo da história, vem sendo expulso da terra, mas frequentemente a ela retorna, mesmo que para tanto, tenha que migrar para outro lugar distante de sua terra natal. Os processos de exploração e expropriação que os/as camponeses/as sofreram e ainda sofrem são decorrentes da expansão do capital sobre a terra. “É por isso que boa parte da história do campesinato sob o capitalismo é uma história de (e)migrações” (OLIVEIRA, 2007, p. 11). “Por essa razão, o nosso camponês não é um enraizado. Ao contrário, o camponês brasileiro desenraizado, é migrante, é itinerante. A história dos camponeses-posseiros é uma história de perambulação” (MARTINS, 1983, p. 17).
Segundo os moradores da comunidade Cabeceira do Piabanha, a família pioneira saiu da Bahia (próximo de Bom Jesus da Lapa), vindo a se instalar as margens do Córrego Cabeceira do Piabanha. Segundo Sol (1981), por volta de 1930, em toda região do baixo Jequitinhonha, principalmente as mais afastadas do Rio Jequitinhonha ainda não tinham sido apropriadas por fazendeiros. “As terras, sobretudo as mais afastadas do rio grande6 e córregos principais, eram praticamente sem donos” (SOL, 1981, p. 27). Geralmente estas localidades, eram ocupadas pelas famílias camponesas para abrirem suas posses com suas roças de toco.
Quando os primeiros moradores chegaram a Cabeceira do Piabanha e abriram posse, a formação de grandes fazendas de gado na região estava em processo de consolidação. Os pioneiros da comunidade encontraram uma fração significativa de remanescentes de mata atlântica que ainda não tinha sido apropriada pela grande fazenda, onde instalaram suas posses. A posse mansa e passiva, não demorou muitos anos. Pois, em 1959, a área foi apropriada pela grande fazenda. Cerca de 7 anos após a chegada dos pioneiros, o Estado de Minas Gerais, por meio de seu Governador, à época, José Francisco Bias Fortes concedeu título de propriedade de uma de área de 4.517,60 hectares – ha (quatro mil, quinhentos e dezessete hectares e sessenta ares) de terras devolutas, em favor de Sylvio Pimenta. A partir desta data, passou a afirmar ser dono das terras ocupadas pelas famílias. Mas até hoje, existem dúvidas, se realmente a área titulada em favor do fazendeiro sobrepõe o território da comunidade tradicional Cabeceira do Piabanha. As famílias contestam, dizem que a área não faz parte da fazenda titulada em favor de Sylvio Pimenta.
O Estado ignorou a presença dos/as camponeses/as que eram posseiros/as ao conceder títulos de terras a latifundiário, ou seja, os/as camponeses/as que eram posseiros/as foram expropriados de seu direito de posse. Dessa forma, as famílias da comunidade Cabeceira do Piabanha perderam suas posses. Isso aconteceu com muitas outras famílias camponesas da região que ocupavam terras devolutas. Ao serem confrontadas pelo poder de prova da propriedade exclusiva, por meio de título de propriedade invocado por um fazendeiro, ficaram sem suas terras, (RIBEIRO, 1996; MOURA, 1988; SILVA, 1999). A legitimação do direito via título de propriedade privada é uma forma de garantir a hegemonia da classe dominante (fazendeiros) sobre os/as camponeses/as, pois os primeiros se beneficiaram do acesso às leis e aos governantes para se apropriar das terras/posses dos/as camponeses/as. Ao garantir o direito de propriedade ao fazendeiro, o Estado “suprime” o direito de posse das famílias da comunidade Cabeceira do Piabanha. Essa prática, na região do Jequitinhonha era recorrente, pois, “[…] indivíduos poderosos que dispunham de cacife político para se tornarem tais, encampavam extensas terras livres, habitadas por indígenas e posseiros e até propriedades parcelares, habitadas por sitiantes desvalidos” (MOURA, 1988, p. 15).
No caso em questão, mesmo sendo titulada pelo Governo em 1959, a fazenda só foi registrada no Cartório de Registro de Imóveis, em 24 de abril de 1961, consolidando a invasão das posses das famílias posseiras lá existentes. Assim, como diz Moura, a fazenda em processo de formação, “transforma, num passo de mágica pequenos posseiros em invasores de terra, quando na realidade se trata de invadidos nas terras em que moravam e que roçavam” (MOURA, 1988, p. 22). Na região do Jequitinhonha, com a instalação da grande fazenda, os/as posseiros/ as tiveram suas terras invadidas pelas grandes fazendas. Não restando muitas opções, para continuar na condição de camponeses/as, maioria passou a viver como agregado, sob o mando de fazendeiros. “A glória da fazenda foi dominar a mata, e a glória do fazendeiro foi usufruir deste domínio e, por meio do domínio da terra, subordinar outros homens” (RIBEIRO, 2003, p. 04).
Algo bem semelhante ocorreu com as famílias da comunidade Cabeceira do Piabanha. Após o Estado conceder o título da terra ao fazendeiro, as famílias que tinham a posse efetiva, ficaram destituídas do “direito” de posse. Sendo portador do título de 4.517,60 ha de terras devolutas, mesmo sem antes tê-la ocupado de fato, o fazendeiro passa a ter o direito de propriedade privada da terra e exercer o seu mando, não só sobre a terra, mas também sobre as famílias. Com o “território apropriado” pelo fazendeiro por meio do documento, as famílias passaram a viver no interior da fazenda, a partir de então, como agregadas.
Embora, a agregação seja coisa do passado (final da década de 1980), na memória dos comunitários mais velhos da comunidade, o tempo do agrego ainda está presente. Recordam de um tempo em que seus pais eram obrigados a trabalhar na fazenda toda vez que eram convocados. Caso descumprisse a ordem, seriam punidos com a destruição das roças ou expulsos da terra, muitas vezes, com uso da força, da violência.
A função mais significativa dos agregados, não só no caso em estudos, mas em quase toda a região do baixo Jequitinhonha, fora a derrubada da mata atlântica para a formação de pastagens para criação de gado extensivo, (MOURA 1988; RIBEIRO, 1996). No caso Cabeceira do Piabanha, a além da derrubada da mata, as famílias também tinham que prestar de serviços na fazenda Monte Cristo ou Lua Nova na manutenção das pastagens, construção de cercas e outras tarefas cotidianas. A agregação no Jequitinhonha criou as condições concretas para viabilizar o latifúndio para a criação de gado extensivo. Pois, além de apossar das terras camponeses/as, utilizou estes mesmos para a derrubada da mata, muitas vezes, sem custos ao fazendeiro. Na memória dos comunitários de Cabeceira do Piabanha, as normas impostas pela fazenda ainda são bem viva.
“Essas famílias eram obrigadas a manter essa ordem dele. Atender esse mandado dele. Para fazer o trabalho na fazenda Lua Nova, os três dias lá e os dois dias para a pessoa, para a família mesmo. Quando a família não atendia essa ordem dele, ele pegava, mandava os vaqueiros colocar gado. A roça que cabia 50 vacas, ele mandava colocar 500 vacas na roça da pessoa. Judiava da pessoa o máximo que pudesse, pá depois mandar a polícia. Vinha com jagunço, polícia e marrava as pessoas e colocava no caminhão e exportava. Meu sogro mesmo, aconteceu isso. O Otaviano saiu marrado, mas depois que destruiu a roça dele. O Antônio Branco, ele passou o jirico, o trator, ele jogou o trator e jogou os cacho de banana da terra que dava mais de 50 quilos cada um cacho. O pobizihho do velho gritando e pedindo pela amor de Deus para não derrubar as benfeitoria dele, que ele vivia daquilo e o tratozão comendo de concha lá e derrubando tudo.”7
Outro comunitário descreve a expulsão de sua família e revela a forma truculenta que o fazendeiro utilizou durante o despejo da família. “Eles derrubaram, eles passaram o trator numa roça, numa chácara de café que meu pai tinha aí dentro. Nós fomos tirados aí com a polícia e levou nós para a São Vicente e despejou a gente como se fosse um monte de lixo”8. Os comunitários afirmam que na época do fazendeiro, não podia plantar nada além de feijão, milho, mandioca e hortaliças. As famílias não tinham frutas nenhuma, pois o fazendeiro mandava destruir. “Tinha medo, pois se a gente plantasse, ele mandava rançar. Era medo dele vim e rançar. Os primeiros morador que tinha aqui, ele fez isso. Ele rançou”.9 “O Antônio da Cesta plantou pé de tanja, limão, laranja, pé de jaca e ele chegou e mandou rancar tudo. Já tava dando fruta já”.10
Morar na fazenda como agregado teria que ser fiel às regras estabelecidas pela fazenda. Para ser aceito e permanecer como agregado teria que ser bom para com o fazendeiro, se não era bom, teria que sair. Analisando as formas de expulsões de agregados das fazendas do Jequitinhonha, Moura (1988, p. 97) diz que,
Há aqui um sistema comportamental calcado na enumeração de obrigações, interrompidas quando não se quer mais favorecer, encerrando os compromissos que unem as partes envolvidas. A maneiras de cessar a relação se faz pela interrupção abrupta da bondade. Ela fornece sinais de que a convivência não mais satisfaz o lado dominante, e este deixa de ser benfeitor.
Para o lado dominado, não há apelação possível. Como os termos da relação eram controlados pelo fazendeiro, qualquer acordo que inclua a continuidade da relação ou sua supressão supõe sua aceitação do acordo nas bases propostas pelo mesmo. A solução encontrada para uma relação indesejada é de supressão abrupta e violenta do favor concedido.
Se a família camponesa não faz jus a tal “bondade” do fazendeiro de lhe conceder morada, esta é retirada da terra, em muitos casos, com o uso da força. Neste sentido, ser fiel aos mandos do fazendeiro, não é exatamente uma forma de submissão, mas sim, a única forma que a família tinha para permanecer em seu chão de morada. As formas de romper com a relação agregado e fazendeiro, não era só a violência direta contra as pessoas. Outras formas de supressão da relação eram recorrentes, como a proibição de fazer novas roças, colocar gado dentro das roças e destruição de plantação, principalmente as frutíferas.
Quase todas as pessoas da comunidade que foram vítimas destes despejos violentos, ao relatar os fatos, mesmo depois de quase meio século, caíram em prantos de choro. Ficou evidente o sentimento de humilhação, raiva e injustiça. Segundo Margarida Maria Moura, além da violência praticada no despejo, o ato de “desobstruir e desembaraçar”, ou seja, ao deixar a casa – o canto de morada e de trabalho, sair significa também, tirar da família a vergonha, os sentimentos de brio e de pertencimento ao lugar de vida, (MOURA, 1988, p. 99). Segundo Ribeiro (1996, p. 28), nas fazendas do Jequitinhonha e Mucuri, “a autoridade do fazendeiro era imposta com muita força em sua fazenda, formando um conjunto de normas”.
Na maioria dos relatos de expulsão de famílias da comunidade Cabeceira do Piabanha aparece a Polícia Militar. A polícia, nestes casos assumiu a defesa dos fazendeiros e de sua propriedade. A presença da Polícia Militar representa o Estado nestes litígios. Na prática, é um Estado autoritário compromissado em implementar e sustentar a política das classes dominantes, ou seja, manutenção da estrutura agrária vigente, (MARTINS, 1982, 1983; SILVA, 1999; OLIVEIRA, 1991).
Com a morte do fazendeiro, na década de 1990, a comunidade passou a ter liberdade no uso do território. Não sendo mais obrigatória a prestação de serviços nas fazendas. “As coisa foi melhorar depois que o véi morreu, aí o povo foi criando uma coragenzinha e, e foi fazendo as coisa”.11 A partir da ausência dos fazendeiros, as famílias estabeleceram um uso cada vez mais estável do território, mais autônomo, passaram a construir casas e fazer as roças em áreas que antes não faziam. Começaram a criar gado que antes também tinha restrições. A diversificação de culturas foi sendo ampliada, incluindo culturas que eram proibidas anteriormente, como: coco, laranja, limão, cacau, banana, manga e muitas outras. “Devagarzinho você vai plantando uma coisa ali e não acontece nada, cê vai plantando outra. Cê vai tomando a liberdade de, de fazer as coisa”.12
Com a ausência da estrutura de poder exercido pelo fazendeiro, as famílias estruturaram um território comunitário. Sendo que a liberdade entre os comunitários é o elemento edificante. Tal liberdade é constituída principalmente, no compartilhamento da terra para construção de moradias e para produção. O uso comunitário se expande também, para os demais recursos naturais, como a utilização da água com diversos usos, da mata para extração de espécies vegetais, para a caça e pesca, entre outros usos. Para os comunitários a Cabeceira do Piabanha, desde a década de 1900, é um território casa, “mãe de todo mundo” 13 onde se vive em liberdade, “é um vale rico de água e pão” 14 e, se é filho do lugar “não se pede licença para entrar” 15 e construir sua morada.
Mas o Estado de Minas Gerais colocou em xeque parte da liberdade ali existente. Pois, o território de residência, (re) produção e resistência, ocupado a cerca de 70 anos, em 18/02/2008 foi todo incluído dentro da área do Parque Estadual Alto Cariri, criado pelo Decreto nº. 44.726, assinado por Aécio Neves, na época Governo do Estado. O referido parque é composto por uma área de 6.151,1380 hectares, que se localiza entre os municípios de Santa Maria do Salto e Salto da Divisa, Minas Gerais (FIG. 2).
Figura 2 – Mapa do Parque Estadual Alto Cariri na cor ver e a localização da área de estudo em cinza escuro.
Para os/as comunitários/as, detentores de um profundo sentimento de pertencimento ao “lugar”, o Território Cabeceira do Piabanha “é uma casa que ninguém pede licença a ninguém para poder entrar”, deste modo, o Governo de Minas Gerais, ao criar o Parque Estadual do Alto Cariri, adentrou no território desconsiderando os vínculos territoriais tradicionalmente construídos entre as famílias e o “seu lugar”. Segundo os/as comunitários/as, em nenhum momento foram procurados por órgão ou agente público para esclarecimento sobre a criação do Parque, ou seja, não houve consulta as famílias.
Durante o processo de criação do Parque Estadual do Alto Cariri foram realizadas audiências nas cidades de Santa Maria do Salto e Salto da Divisa, entretanto, os/as comunitários/ as da comunidade tradicional Cabeceira do Piabanha afirmam não terem sido informados/ consultados. Se a comunidade não foi consultada, o procedimento não atendeu em sua plenitude, o preceito legal da consulta pública, explícito no Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC) – Lei Nº 9.985/2000 e na Lei 20.922, de 16 de outubro de 2013, que dispõe sobre as Políticas Florestais e de Proteção à Biodiversidade no Estado de Minas Gerais. No Art. 44, da referida Lei Estadual, no § 3°, diz que “o poder público fornecerá informações adequadas à compreensão da população local e outros interessados”.
Neste caso, o Estado não cumpriu com todos os preceitos legais, ao não garantir que as famílias da comunidade tradicional Cabeceira do Piabanha fossem informadas de forma objetiva e com linguagem compreensível aos/as comunitários/as, demonstrando as consequências que a criação do parque causaria para a comunidade. Segundo Diegues e Viana (2004, p. 24), nos processos de criação de unidades de conservação, as formas de consultas públicas realizadas pelos órgãos do Estado, geralmente são realizadas por meio de “[…] reuniões mal organizadas apenas para legitimar decisões tomadas à distância, para garantir uma roupagem mínima exigida por doadores internacionais, governos, etc”.
Segundo Pimentel e Ribeiro (2016), a criação de unidades de conservação, são ações projetadas em escala global, sem levar em consideração a realidade local ou regional. Essa política vertical causa diferentes graus de exclusão, principalmente para as comunidades tradicionais atingidas. Os processos de exclusão vão desde a falta de participação no processo de criação e gestão, que em suma, são controlados com exclusividade pelo Estado, até a exclusão total dos territórios que são os meios de reprodução social, econômico e cultural das comunidades. Segundo Arruda (1999, p. 83), com algumas exceções, no Brasil, a ideia de unidade de conservação é a mesma concebida pelos Estados Unidos no século passado. É uma ideia de uma natureza intocada para ser venerada pelo ser humano, bem como, para “refazer suas energias materiais e espirituais e pesquisar a própria natureza”.
Na comunidade Cabeceira do Piabanha ocorrem conflitos da década de 1960 até final de 1980, período da imposição das regras da relação fazenda e agregado. Entre 1990 a 2008, com a morte do fazendeiro, houve um período de liberdade. Em 2008, com a criação Parque Estadual Alto Cariri, novos conflitos surgiram. Mas, a partir de 2014, a situação ficou mais tensa. Principalmente, depois que o Deputado Estadual Carlos Pimenta entrou com o Projeto de Lei – PL nº 1480/2015 (originado do antigo PL nº 4.743/2013), na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), propondo alterar os limites do Parque Estadual do Alto Cariri. A justificativa apresentada no texto original do projeto é adequar o perímetro do parque ajustando a vegetação da região, substituindo uma área de 368,72 hectares (ha), que segundo o projeto está antropizada, com a presença de 12 famílias, por outra de 436,86 ha, composta por fragmentos de floresta estacional semidecidual, capoeirinha, capoeira e capoeirão.
No processo de criação do Projeto de Lei (PL) 4.743, publicado no Diário do Legislativo em 29/11/2013, atual PL 1480/2015, mais uma vez, a comunidade foi lesada quanto ao direito de ser consultada. Pois, segundo os comunitários, em nenhum momento, foram procurados por órgão ou agente público informando sobre a proposta de alteração nos limites do Parque. Recordam que estiveram algumas pessoas visitando a área e fazendo perguntas as famílias, mas sem dizer para quais objetivos. Na verdade, o que fica evidente, é que, mais uma vez, o Estado, faltou com sua responsabilidade ao não consultar a comunidade sobre as alterações propostas pelo referido projeto.
Em parecer da Comissão de Constituição e Justiça da ALMG, do dia 28/05/2014, em que a comissão aprova o projeto de lei, na época de nº 4.743/2013, depois de discorrer sobre a legislação Federal e Estadual, a comissão reconhece que não houve consulta pública, conforme prevê a legislação. No entanto, conclui dizendo que, em relação exigência de consulta pública, poderia ser satisfeita no curso do processo legislativo. Em novo parecer sobre o projeto, do dia 21/06/2017, a Comissão de Constituição e Justiça da ALMG, conclui que ainda tinha havido consulta pública e, novamente, diz que deveria ser realizada no curso do processo legislativo. A consulta prévia e as informações necessárias à comunidade com relação à alteração nos limites do parque não se efetivaram, o que se pode compreender como manifesta violação de legislação Federal e Estadual.
A iniciativa de mudar os limites do Parque Estadual Alto Cariri, não foi do Estado, mas de um deputado sob influência de um ruralista, que inclusive tem interesses no local, ou seja, diz possuir propriedade da área e com frequência tem utilizados de meios diversos para expulsar as famílias do local. Fica evidente que o projeto não tem o real interesse em contribuir para atingir os objetivos contidos no decreto de criação Parque Estadual do Alto Cariri, conforme a justificativa apresentada. E, muito menos, tem objetivo de resolver os problemas das famílias da comunidade Cabeceira do Piabanha, como afirmam seus autores e interessados. Isso ficou mais explícito ainda com os fatos ocorridos a partir do início da tramitação do referido projeto. As pessoas que são protagonistas do projeto de lei e, que dizem possuir direito de propriedade no local, passaram a fazer vários tipos de pressões para as famílias saírem do território. Inclusive, com ameaças de morte contra as famílias e assédio financeiro. Como maioria das famílias resistiram contra as diversas ameaças sofridas, em 2016, os pretensos proprietários, impetraram uma ação de reintegração de posse contra as famílias, deixando-as com medo de perder o território tradicional.
Na prática, a desafetação da área do parque, busca atender a interesses minerários da Empresa Nacional de Grafite. Ao buscar informações no sítio do DNPM (Departamento Nacional de Produção Mineral), sobre a possível existência de minério, verificamos que realmente existe uma reserva de grafita dentro da área que se propõe a desafetação. A qual também coincide com o território da comunidade Cabeceira do Piabanha. Tal reserva de grafita com processo de nº 831863/1992 no DNPM, tem como titular a empresa Nacional de Grafite. Atualmente, na fase de requerimento de lavra. A referida mineradora, não aparece como autora dos conflitos, mas sim, os supostos herdeiros do Sylvio Pimenta. Supostamente, a mineradora terceiriza o conflito, pois a mesma tem interesse em explorar a área.
Na prática, a desafetação de parte da área do Parque Estadual Alto Cariri, como querem os proponentes do Projeto de Lei, ao que indicam as evidências, significa colocar a área a serviço do capital. Neste caso, a serviço da mineração. Para a comunidade tradicional Cabeceira do Piabanha, a desafetação com a finalidade de minerar, significa a perda do seu território tradicional. É notório que os autores do projeto em tela, a empresa e o Estado de Minas Gerais, empreenderam e ainda empreendem um grande esforço para mudar os limites do Parque Estadual Alto Cariri. Ora utilizando instrumentos legais, ora violando as leis e/ou banalizando- as para servir quando e como convir. Para atender os interesses do capital “há sempre uma dialética entre o legal e o ilegal na concepção e construção destes grandes empreendimentos” (JUNIOR et al, 2018, p. 153).
Considerações Finais
A história da comunidade tradicional Cabeceira do Piabanha – Salto da Divisa é um exemplo que ilustra bem, como o capital apoiado pelo Estado, se vale de meios lícitos e ilícitos para garantir sua reprodução ampliada. É notório, que no decorrer do processo histórico, desde a ocupação, em 1952, até a atualidade, vem ocorrendo uma sequência de ilegalidades contra a comunidade praticadas por fazendeiros apoiados pelo Estado e, nas últimas décadas, passou a ser apoiados também, por empresa do setor da mineração com objetivo de garantir a territorialização do capital naquela localidade.
Historicamente, as famílias são vitimas de processos de exploração e expropriação, em muitos casos, precedidos por atos de violência e pela imposição do trabalho como forma de dominação e com isso, instituiu um domínio fundiário, condição fundamental para a sujeição do trabalho das famílias como agregadas por muitos anos. A submissão por parte das famílias, quando foram obedientes às regras impostas pela fazenda, não representou uma forma de submissão em si, mas sim, a única forma de permanecer em seu território.
É notório que desde sua origem, a comunidade vem sendo vítima da presença do Estado e/ou de sua ausência. A ação do Estado ficou mais evidente quando se instituiu uma política agrária por meio de uma legislação que favoreceu a concentração da terra, constituindo-se como mecanismo de exploração e expropriação das famílias da comunidade. Outra ação estatal que atingiu a comunidade foi criação do Parque Estadual Alto Cariri que se efetivou por meio do uso de mecanismos políticos-jurídicos e até coercitivos ao impor regras preservacionistas ao território.
No processo de criação da referida unidade de conservação e no processo de tramitação do Projeto de Lei 1480/2015, que propõe alterar os limites do parque, o Estado se “ausentou” e não cumpriu com todos os preceitos legais ao não garantir que as famílias fossem informadas de forma objetiva e com linguagem compreensível as consequências que a criação do parque causaria para a comunidade.
Diante dos diversos processos de exploração e expropriação sofridos, a comunidade tem buscado estratégias de resistência, que até o momento, tem garantido sua permanência no território. Historicamente, muitas dinâmicas organizativas foram empreendidas pela comunidade na constituição do território nominado pelos comunitários de Cabeceira do Piabanha, destacando o uso comunitário (regime de usos comum), bem como, outras estratégias de resistências e defesa territorial.
A partir de 2014, mediante acirramento dos conflitos, tem buscado apoio externo para potencializar e externalizar suas reivindicações. E mais recentemente acionou a identidade coletiva como comunidade tradicional agroextrativista e artesã apropriando-se do direito de se autodefinir. Sendo reconhecida em 15/06/2018, pelo Governo de Minas, sob o Processo nº 1640.01.0001745/2018-87 e, em seguida, encaminhou documentação solicitando a regularização fundiária do território com base no Decreto Estadual n° 46.671 de 16/12/2014 e Decreto 47.289 de 20/11/2017. O processo de regularização fundiária foi aberto sob o Processo nº 1640.01.0001838/2018-98, do dia 21/11/2018. Embora, devido à morosidade do Estado, o processo está parado. Todas as formas de lutas e resistência empreendidas pela comunidade são por nós, compreendidas como estratégias de defesa territorial para garantir a sua existência enquanto comunidade socioculturalmente diversa da sociedade.
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NOTAS.
1 -Mestre em Estudos Rurais e Licenciado em Educação do Campo: Ciências Humanas e Sociais, Ciências da Natureza e Matemática pela UFVJM; Agente da Comissão Pastoral da Terra – MG.
2 – Mestra em Desenvolvimento Social pelo Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Social da UNIMONTES, 2017. Pedagoga – PUC-MINAS, 2009. Participante do grupo de pesquisa Opará – Unimontes. Documentarista do Caderno de Conflitos no Campo/ CPT-MG. Assessora do MPP/MG.
3 – Informação verbal – Depoimento de Juarez Ferrei nascimento (Tatá), no dia 10/12/2017.
4 – Informação verbal – Depoimento de Luzeni (esposa do Tatá), no dia 10/12/2017.
5 – Sobre o Parque Estadual Alto Cariri, veremos a frente.
6 – O autor se refere ao rio Jequitinhonha, que antes era conhecido por rio Grande.
7 – (Informação verbal – Nivaldo Morais Nascimento, 37 anos – 09/02/2018, comunitário da Cabeceira do Piabanha).
8 – Informação verbal – Aldair – 10/01/2018. Aldair é filho de Antônio Branco que fora expulso pelo fazendeiro do território por não ir prestar serviço na fazenda Lua Nova quando era chamado.
9 – Informação verbal – Luzeni Ferreira da Silva, 53 anos, 10/01/2018.
10 – Informação verbal – Juarez Ferreira Nascimento – Tatá, 55 anos, 10/01/2018.
11 – Informação verbal – Marinez Alves da Silva, 39 anos – 17/02/2018;
12 – Informação verbal – Marinez Alves da Silva, 39 anos – 17/02/2018
13 – Nivaldo Morais Nascimento, 37 anos – 17/02/2018.
14 – Nivaldo Morais Nascimento, 37 anos – 17/02/2018.
15 – Marinez Alves da Silva, 39 anos, 17/02/2018.