Pelos Direitos das Comunidades Pesqueiras e Quilombola de Degredo, no Espírito Santo
O Jornal Século Diário divulgou matéria no dia 9 de janeiro de 2019 informando a lamentável e repugnante decisão do juiz Federal Mário de Paula Franco Júnior, da 12ª Vara Federal de Belo Horizonte, em Minas Gerais, assinada no dia 27 de dezembro de 2018 (durante o recesso judicial) que, a pedido da Fundação Renova (FR) – entenda-se as mineradoras Samarco, Vale e BHP Billiton -, decidiu pela suspensão do fornecimento de água potável para a Comunidade Quilombola de Degredo, em Linhares, no norte do Espírito Santo. A Comunidade Quilombola Pesqueira de Degredo é uma das centenas de comunidades não apenas atingidas, mas golpeadas pela lama tóxica oriunda do crime e tragédia continuada que se iniciou com rompimento da Barragem de Fundão, da Samarco/Vale e BHP Billiton, na tarde de 05 de novembro de 2015.
Segundo o defensor público do estado do Espírito Santo, Sr. Rafael Portela Santos: “A Samarco valeu-se de um estudo técnico que sequer foi discutido nas instâncias de governança. O documento só apareceu após a aplicação de multa às mantenedoras, uma vez que a Fundação Renova se negava a fornecer água potável à comunidade de Degredo”.
A decisão da justiça federal, acima referida, contraria a Nota Técnica nº 10/2018, da Câmara Técnica Indígena e Povos e Comunidades Tradicionais (CT-IPCT) que orienta a instalação da água potável por parte das empresas infratoras, insistindo ainda nos efeitos psicológicos da comunidade com relação ao consumo da água subterrânea após a tragédia crime, bem como, as deliberações do Comitê Interfederativo (CIF) – instância máxima das decisões administrativas envolvendo as ações de compensação e reparação pela tragédia/crime da Samarco/Vale/BHP Billiton. Além disso, a decisão da 12ª Vara Federal é flagrantemente inconstitucional, pois desrespeita um dos princípios fundamentais da Constituição Federal de 1988, respeito à dignidade da pessoa humana. E mais: água é um bem comum que não pode ser (so)negado e a ninguém. Também o rio, as águas e toda a natureza têm direitos, inclusive o direito de dessedentar seus filhos e filhas, que são os seres humanos e todos os seres vivos.
Junta-se a esta absurda e injusta decisão uma outra ainda expedida no mesmo dia, no entanto, ainda mais devastadora que prevê a modificação de 1500 acordos feitos com cerca de nove mil pescadores do ex-rio Doce. Pela decisão, o pagamento feito em auxílios emergenciais mensais poderá ser descontado das indenizações, o que seria mais outra grande injustiça com os atingidos.
Não se pode aceitar que pressões e interesses de empresas criminosas como as mineradoras Samarco, Vale e BHP Billiton interfiram nas decisões de magistrados e instituições públicas, que devem defender os interesses das comunidades afetadas e violentadas, os direitos humanos fundamentais, de povos tradicionais como quilombolas e pescadores artesanais (reconhecidos e protegidos por organismos internacionais como a Convenção 169 da OIT, da ONU, por exemplo) e o meio ambiente, inclusive.
Belo Horizonte, 10 de janeiro de 2019.
Assinam esta Nota:
Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva (CEDEFES)
Federação das Comunidades Quilombolas-N´Golo
Comissão Pastoral da Terra (CPT/MG)
Articulação Metropolitana de Agricultura Urbana (AMAU)
Associação Nacional de Ação Indigenista (ANAI)