Vitória do Povo e da sua memória! MPF embarga obra contratada pela mineradora Vale, que ameaçava Cemitério de Pessoas Escravizadas após denúncias de graves violações ao patrimônio cultural em Miguel Burnier, Ouro Preto, MG
Obra contratada pela mineradora Vale S/A, que ameaçava o campo sagrado Cemitério de Pessoas Escravizadas, pertencente ao Conjunto Tombado histórico-arquitetônico e arqueológico da Igreja Nossa Senhora Auxiliadora de Calastrois, no distrito Miguel Burnier, município de Ouro Preto, MG, foi finalmente EMBARGADA depois de uma séria de denúncias.
No início do mês de setembro de 2023 foi denunciado por meio das entidades: Conselho Internacional de Monumentos e Sítios (ICOMOS), Fórum de Entidades em Defesa do Patrimônio Cultural Brasileiro-Núcleo Minas Gerais, Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva (CEDEFES) e Comissão Pastoral da Terra (CPT/MG) para a Prefeitura Municipal de Ouro Preto, Ministério Público no âmbito Estadual e Federal, com o apoio dos gabinetes da deputada estadual Bella Gonçalvez (PSOL) e dep. Leleco (PT). Todavia, notou-se uma lamentável letargia por parte da Prefeitura Municipal de Ouro Preto em tomar providências. Tendo em vista a falta de providências foram feitos contatos também com o Conselho Nacional Quilombola-CONAQ e com Ministério da Igualdade Racial, em Brasília.
Finalmente, o Ministério Público Federal em resposta ao gabinete da deputada estadual Bella Gonçalvez (PSOL), informou que a 4ª Câmara (Meio Ambiente e Patrimônio Cultural) solicitou perícias de técnicos da 13ª SR IPHAN no local, e que constataram irregularidades da obra em relação ao conjunto tombado e sua ambiência.
A Dra. Silmara Goulart, Procuradora da República, do MPF, munida das avaliações do IPHAN, determinou a imediata paralização, conforme Despacho (Notícia Fato n. 1.22.000.002695/2023-46-PRMG). Segue trecho:
Não podemos permitir que empreendimentos desta natureza coloque em risco os já tão ameaçados patrimônios históricos, arqueológicos, arquitetônicos e culturais de Miguel Burnier, em Ouro Preto, aparentemente abandonados. Por isto, foi solicitada a paralização imediata da obra.
Consideramos que a mobilização com o apoio do ICOMOS, do FÓRUM, da CONAQ, do CEDEFES, da CPT e dos gabinetes da Deputada Estadual Bella Gonçalves e dep. Leleco foram fundamentais para que a 4ª Câmara da PGR – Meio Ambiente e Patrimônio Cultural, tomasse as devidas providências, indicando a paralização imediata de obra.
Esperamos agora que a mineradora Vale e sua contratada empreiteira Norberto Pimenta sejam devidamente multadas por tamanho dano e falta de precaução, e que tal penalidade sirva de exemplo a outros empreendimentos e obras que coloquem em risco cemitérios de pessoas escravizadas e demais bens culturais e naturais em geral.
Entenda a grave situação. A empreiteira Norberto Pimenta contratada da Vale S/A, estava realizando terraplanagem, movimentação de terra e desmatamento de vegetação nativa no entorno imediato do cemitério de pessoas escravizadas da antiga São Julião, do séc. XVIII, que faz parte de conjunto tombado, composto ainda por edificação da antiga Igreja Nossa Senhora Auxiliadora de Calastrois, coreto e cemitério atual. O antigo cemitério das pessoas escravizadas de São Julião, constituído por muros de alvenaria de pedra foi severamente ameaçado por esta obra que avançava em sua direção, sendo que o maquinário chegou rente aos muros de alvenaria de pedra, o que gerou grande preocupação e indignação da comunidade local e de pesquisadores que lá atuam. Foi constatada intervenções danosas em sua ambiência com a supressão de mata rupestre. O cemitério é importante relíquia da memória das pessoas escravizadas e de seus ancestrais, se tratando de campo sagrado de interesse material e imaterial para a profunda história de Ouro Preto e de Minas Gerais. Este mesmo conjunto, dentre outros na localidade, já foi objeto de pesquisa tendo sido publicado em obra referente à memória de São Julião intitulado: “Marcas Históricas – Miguel Burnier”, datado de 2012 (cf. p. 209 a 217). Este belíssimo conjunto também foi objeto de inventário em 2007 e de tombamento municipal em 27 de novembro de 2012, em função da necessidade de sua proteção eficaz e da sua grande significância patrimonial. |