Vitória! Trinta famílias ameaçadas de despejo em Ravena, Sabará, MG, conquistam liminar de suspensão do despejo. Nota.
Atendendo ao pedido judicial da Defensoria Pública de Minas Gerais, dia 24 de agosto de 2022, a juíza de Direito, Dra. Luciana Santana Comunian Starling, do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) suspendeu uma ação reivindicatória transitada em julgado, em fase de execução, tendo em vista várias irregularidades no decorrer do processo. Trata-se de um caso de grilagem de terras em Ravena, município de Sabará – MG.
Um empresário grileiro entrou com ação reivindicatória, alegando ser proprietário, para despejar cerca de trinta famílias de agricultores familiares que estão no terreno, entre as quais a família da quilombola dona NEUZA SANTOS GONÇALVES e Sr. ANTÔNIO MÁRIO GONÇALVES (Sr. Toim), que estão vivendo no terreno há mais de 150 anos, em várias gerações. O processo correu na justiça por mais de 20 anos. O empresário obteve sentença favorável e as famílias seriam obrigadas a abandonar o terreno, suas moradias, sua história de vida e seu sustento e seriam jogadas na rua, sem saber como sobreviveriam a partir de então.
Nós da Comissão Pastoral da Terra (CPT/MG) e a Comunidade de Barreiro dos Coelhos denunciamos esta brutal injustiça por meio de videorreportagens das várias reuniões realizadas com as trinta famílias e buscamos o apoio da Dra. Ana Cláudia Alexandre, da Defensoria Pública de Minas Gerais, que solicitou judicialmente a revisão da sentença, pois a Defensoria não foi intimada em momento algum no decorrer do processo e devido a uma série de irregularidades absurdas.
Pela minuciosa análise do TJMG, constatou-se que o terreno em questão foi ilegalmente declarado como propriedade de um engenheiro por adjudicação errada, tendo em vista que foi incluído indevidamente, por já ter sido desmembrado e vendido anteriormente. O engenheiro sabia disso e doou a totalidade do terreno adjudicado para uma entidade sem fins lucrativos, a Ong Núcleo Assistencial Caminhos para Jesus. Diz a juíza Dra. Luciana Santana na decisão de suspensão: “A matrícula n.º 14.846 do CRI de Sabará e a matrícula n.º 24.251 do CRI de Sabará estão viciadas por nulidade absoluta, decorrente de doação a non domino, cuja fonte foi um vício da r. sentença adjudicatória nos autos do inventário n.º 4.437, que expandiu em 2,0 hectares os limites reais do título translatício.” E continua a juíza: “Não se pode olvidar que, segundo bem lembra Paulo Otero, ‘como sucede com os outros órgãos do poder público, também os Tribunais podem desenvolver uma atividade geradora de situações patológicas, proferindo decisões que não executem a lei, desrespeitem os direitos individuais ou cujo conteúdo vá ao ponto de violar a Constituição’” (Coisa Julgada Inconstitucional. Coordenador Carlos Valder do Nascimento. Rio de Janeiro: América Jurídica, 2003, 3a ed., pp. 80/81).”
A juíza Dra. Luciana Santana enfatiza: “Vê-se que Núcleo Assistencial Caminhos para Jesus doou para Frank Ferreira uma área de 2,0 hectares que, em verdade, material e validamente, nunca integrou seu imóvel. Isto porque, Mozart de Moura somente poderia ter adjudicado 7,6 hectares (que adquiriu) e somente poderia ter doado 7,6 hectares. Tudo o mais representa doação a non domino,” sem pé e nem cabeça, ou seja, grilagem judicial.
A juíza concluiu: “A verdade dos fatos é que Mozart Ferreira nunca adquiriu 9,6 hectares de terra, mas apenas 7,6. Por um erro, acabou logrando êxito em obter, concessa venia, uma sentença adjudicatória viciada, que propagou o vício para a matrícula n.º 14.846 do CRI de Sabará, aberta em nome do adjudicante Mozart Ferreira. Posteriormente, Mozart Ferreira efetua doação total da área constante na matrícula nº 14.846 para Núcleo Assistencial Caminhos para Jesus, incluindo a área que lhe sobejava por erro, pertinente a 2,0 hectares. Ao perceber algum problema relativamente a uma área de 2,0 (dois) hectares, o próprio FRANK FERREIRA contatou o Núcleo Assistencial Caminhos para Jesus para “REGULARIZAR A SITUAÇÃO”. É dizer: tal situação, não esclarecida nos autos, foi que ensejou a doação sub judice e que, como já fundamentado, é nula por não guardar simetria com o título causal.”
Sabendo dos fatos, o empresário procurou a entidade e recebeu dela a doação do terreno que, na realidade, nunca fez parte das transações, pois não poderia estar incluído na adjudicação.
Então, O QUE DEVERÁ OCORRER, NA REALIDADE, SERÁ A ANULAÇÃO DE DUAS SENTENÇAS: a primeira, referente à adjudicação com vício e a segunda, referente ao reconhecimento de propriedade do terreno, reivindicada pelo empresário grileiro. Isso se chama de grilagem judicial, ou seja, irregularidades brutais que comprovam falsidade de documentos, o que é grave perante o poder Judiciário.
A juíza escreve na decisão que suspendeu a reintegração (despejo): “Diante disso, criou-se um estado de coisas patológico, com duas sentenças formais viciadas por nulidade absoluta, decorrentes de cadeia registral de áreas adjudicadas e doadas a non domino, sem que tais questões tenham sido suscitadas ou julgadas, em qualquer momento, no bojo de todos os processos entre as partes.”
Diante desta descoberta de várias irregularidades e ilegalidades, a juíza Dra. Luciana Santana, do TJMG, DEFERIU (APROVOU) A LIMINAR para suspender o despejo das trinta famílias e intimou a Ong Núcleo Assistencial Caminhos para Jesus para contestar, se quiser, no prazo de 15 dias a doação nula que realizou. Caso o empresário recorra da suspensão do despejo, certamente irá perder no recurso, pois as irregularidades constatadas e demonstradas são gravíssimas. Com alegria comunicamos mais uma vitória da Luta Popular por Direitos, em Ravena, município de Sabará, na região metropolitana de Belo Horizonte, MG.
Assinam esta Nota:
Comunidade Barreiro dos Coelhos, de Ravena, Sabará, MG
Comissão Pastoral da Terra (CPT/MG)
Sabará, MG, 06 de setembro de 2022.
Obs.: As videorreportagens nos links, abaixo, versam sobre o assunto tratado, acima.
1 – “Quem tem muito tomando o pouco dos pobres!” Violência brutal! 30 Famílias! Ravena/Sabará/MG Vídeo 1
2 – Despejo? “Nasci aqui. Meu pai nasceu aqui. Não saio daqui.” 30 famílias camponesas. Ravena/Saberá/MG
3 – “Há + de 100 anos no lugar e ser despejada?” Não! Injustiça c famílias camponesas, Ravena, Sabará/MG